
Situação da companhia aérea preocupada credores e seu futuro depende do desenrolar do plano de reestruturação, segundo fontes
A companhia aérea Voepass entrou na mira de arrendadores e corre o risco de sofrer com o esvaziamento de sua frota a depender do desenrolar de seu plano de reestruturação, disseram fontes ao Valor. A situação preocupa os credores, que ainda não têm os detalhes do pedido de tutela preparatória para reestruturação da empresa protocolado no último dia 3, uma vez que o processo corre em segredo de Justiça.
Em agosto do ano passado, uma aeronave da Voepass (modelo ATR) caiu em Vinhedo (SP), deixando 62 mortos, durante o trajeto entre Cascavel (PR) e São Paulo. As causas do acidente ainda estão sendo investigadas.
Em crise desde então, a empresa já perdeu dois aviões em meados de janeiro por falta de pagamentos — as aeronaves eram da Dubai Aerospace Enterprise, empresa que avança com um processo de aquisição de um outro arrendador importante da Voepass: a NAC, com sede na Irlanda. A Voepass tem hoje uma frota de 11 aeronaves ATR.
A Voepass ajuizou um pedido de tutela preparatória para a reestruturação de suas obrigações financeiras de curto prazo e o fortalecimento da estrutura de capital. Segundo a empresa, o pedido — que contempla o reperfilamento da condição de endividamento — visa a organizar os passivos e seu fluxo de caixa.
“Os credores vão olhar o que vai vir da decisão. Quando o juiz tomar sua decisão ela vai ser pública. Neste momento é que eles vão saber a dimensão do que está sendo pedido pela Voepass”, disse uma fonte. No pedido de tutela, a empresa consegue antecipar algumas proteções da recuperação judicial (RJ), seja para proteger seu caixa antes de uma RJ iminente, ou para ganhar tempo de negociação. Resta saber o que a empresa pediu — entre as possibilidades estão postergar arrendamentos, taxas aeroportuárias e até pagamento de combustível.
Em meados de janeiro, a Dubai Aerospace Enterprise (DAE) conseguiu tomar de volta dois aviões da Voepass. À época, a denúncia era de que a companhia, para além de não fazer os pagamentos, havia parado de fazer manutenção nos aviões e estava retirando peças deles para usar em outras aeronaves.
Hoje, entre os dois principais arrendadores da Voepass estão a irlandesas Abelo (com três ATRs) e Nordic Aviation Capital (NAC, com cerca de cinco aviões). Fontes lembraram que no dia 7 de janeiro a DAE anunciou um acordo para comprar 100% da NAC — os valores não forma divulgados. A transação ainda aguarda a confirmação de órgãos antitruste.
“A DAE já tirou dois aviões e recentemente foi anunciado que a companhia está em processo para comprar a NAC. Não é possível saber se uma empresa já tem ingerência sobre a outra. Caso o mesmo racional da DAE prevaleça, a NAC também pode tentar tirar os aviões. Se a Voepass perder mais cinco aeronaves fica impossível manter sua operação”, disse esta fonte.
Fontes lembraram que o modelo ATR usado pela Voepass é bastante disputado mundo afora por sua ampla utilização na aviação regional. No Brasil, além da Voepass, a Azul também opera o ATR. Segundo pessoas do setor, quando um primeiro arrendador resolve desistir de negociar e toma aviões de uma aérea, isso acende um alerta nos demais.
Fontes destacaram que o futuro da empresa está nas mãos da Latam, que usa as aeronaves da Voepass para avançar na aviação regional. A relação entre a Latam e a Voepass começou em 2014 com acordo de “codeshare” (compartilhamento de voos) entre as empresas. Mas foi em 2024 que a Latam jogou essa parceria a um outro nível ao conseguir a aprovação do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) para emissão de debêntures conversíveis pela Voepass que dão direito à Latam de converter seu investimento em até 30% das ações do grupo Voepass — o restante da participação ficaria com a família Felício. O valor do negócio nunca foi divulgado.
Segundo fontes, a necessidade de a empresa entrar em uma recuperação judicial é dada como certa. A Passaredo (antigo nome da Voepass antes da compra da MAP, em 2019) já atravessou uma RJ, que se iniciou em 2012 e foi concluída em 2017.
Fontes lembraram que o Brasil é signatário da Convenção da Cidade do Cabo, ratificada em 2013 pelo país e que prevê que a Justiça tem até 10 dias para determinar uma devolução de um avião ao arrendador em caso de inadimplência. Em casos de reestruturação, o prazo para que o avião seja devolvido é de 30 dias pela convenção.
A Justiça pode decidir dar mais tempo para a empresa (como aconteceu no caso da Avianca Brasil, que conseguiu manter seus aviões por 120 dias), mas essas decisões acabam sendo mal vistas pelo setor aéreo global, que pode vir a penalizar as aéreas do Brasil diante das violações.
Em nota, a Voepass disse que está operando normalmente, garantindo a continuidade das atividades sem impacto para passageiros. “A operação segue dentro da malha vigente com rotas comerciais para mais de 16 destinos, atendendo todas as regiões do país”, disse a aérea. Ela destacou que a reintegração das aeronaves PR-PDZ e PR-PDX não impactou a operação, pois ambas estavam em manutenção.
“A Voepass já deu início ao processo de mediação de forma estruturada com seus credores, reforçando seu compromisso com a transparência e a continuidade do serviço essencial de aviação regional no país”, disse.
Procurada, a Latam disse que mantém acordos de “codeshare” com mais de 18 companhias aéreas em todo o mundo, incluindo o acordo comercial com a Voepass. “A Latam informa que acompanhará os desdobramentos do anúncio realizado pela Voepass e seus efeitos futuros”, disse, em nota.,
Fonte: https://valor.globo.com/google/amp/empresas/noticia/2025/02/08/voepass-entra-na-mira-de-credores-e-corre-risco-de-perder-avies.ghtml