
Sabe-se que a reforma da Lei 11.101/2005 (LREF) trouxe importantes avanços em relação às regras procedimentais da recuperação judicial, buscando dar mais celeridade a este complexo processo, sendo o maior incentivo à negociação entre as partes envolvidas a premissa dessa nova realidade. O legislador de 2020 buscou oferecer novos mecanismos legais para o soerguimento mais célere da empresa recuperanda sem esquecer da segurança e dos interesses dos credores.
Dentre as inovações que têm o intuito de agilizar o andamento da recuperação judicial e que incentivam a negociação mais próxima entre os envolvidos, está a previsão do art. 56-A, que passou a permitir a substituição da Assembleia Geral de Credores (AGC) pela utilização de termos de adesão que comprovem a aprovação do plano de recuperação judicial (PRJ) do devedor por seus credores.
Assim, as deliberações que seriam efetivadas na AGC agora podem ser substituídas por documento escrito assinado pelos credores que concordem com a aprovação do plano da recuperanda, o que diminui os custos e o tempo relacionados com este procedimento deliberativo.
No entanto, para que essa substituição seja possível, o legislador tomou o cuidado de exigir um quórum maior pelos credores que o quórum ordinário previsto no art. 45 da LREF para a aprovação do PRJ. Assim, se na AGC exige-se que a aprovação do plano ocorra pela maioria dos credores presentes no ato, para que ela possa ser substituída pelos termos de adesão exige-se a aprovação pela maioria do “valor dos créditos sujeitos à recuperação judicial” (art. 45-A).
Essa exigência, porém, não parece ter dificultado a utilização desse novo instrumento. Recente decisão proferida pelo juiz da Vara de Recuperação Judicial e Falência de Vitória (ES) homologou o PRJ da Boart & Wire do Brasil[1] sem a realização de AGC, tendo em vista sua aprovação pelos credores por meio de termos de adesão, com observância do quórum legal exigido.
Mais uma decisão recente de homologação de plano aprovado pelos credores por meio de termos de adesão foi proferida no Mato Grosso, pela Vara Regional de Recuperação Judicial e Falência de Cuiabá, na recuperação judicial da ARCA Agropecuária S/A[2]. Além destas, outras decisões semelhantes já foram proferidas por distintos tribunais estaduais[3], todas, sem dúvida, decisões vanguardistas e que abrem espaço para a implementação desse novo mecanismo.
Vale destacar que apresentação do termo de adesão não obsta o exercício do contraditório pelos credores e outros interessados, permitindo que aqueles que se sintam prejudicados com a homologação do PRJ apresentem oposição no prazo de 10 dias a contar da intimação pelo juízo. No entanto, mais uma vez primando pela celeridade e com o fim de impedir manifestações claramente protelatórias, o legislador de 2020 restringiu as matérias que podem ser objeto de oposição pelos interessados, limitando-as a: “(i) o não preenchimento do quórum legal; (ii) o descumprimento de requisito legal; (iii) a irregularidade no termo de adesão ou no plano de recuperação judicial (art. 56-A, §3º)”.[4]
Vale lembrar que tanto a fiscalização quanto ao preenchimento do quórum legal como quanto ao cumprimento de qualquer outro requisito legal cabe ao Administrador Judicial, nos termos do §4º do art. 45-A da Lei 11.101/2005[5]. Da mesma forma, cabe a ele acompanhar a regularidade das tratativas entre as partes, a fim de assegurar a validade dos termos de adesão, sendo possível presumir, então, que o Administrador Judicial poderá solicitar esclarecimentos e/ou informações relacionados aos termos que deverá analisar.
Alguns pontos que talvez mereçam uma análise mais aprofundada desse novo instrumento legal e que cujas respostas dependerão das circunstâncias fáticas de cada caso e do rumo que a jurisprudência entenderá mais adequado, são:
- Caso não seja possível dispensar a realização da Assembleia Geral de Credores pois a recuperanda não atingiu o quórum de votação suficiente com os termos de adesão, os termos por ela obtidos poderão ser utilizados para fins de apuração do quórum de instalação e de votação da referida AGC, em uma espécie de votação “mista”?
- Poderá o credor ser obrigado a assinar um termo de adesão irrevogável e irretratável ou ele sempre poderá comparecer à Assembleia de Credores e votar em sentido contrário à adesão?
Vale lembrar que a recuperanda irá dispender tempo e recursos no intuito de obter os termos de adesão e correrá o risco de todo esse trabalho não ser utilizado pelo fato de não ter conseguido adesões necessárias para atingir o quórum de aprovação de seu plano. E, neste caso, ainda terá que arcar também com o custo da própria AGC que não pode ser dispensada.
De qualquer forma, para além da questão estritamente legal e procedimental, é importante ressaltar que a inovação legislativa constante do art. 56-A da LREF se coaduna perfeitamente com os objetivos almejados pela reforma legislativa de 2020: dar maior celeridade ao processo de recuperação judicial e incentivar ainda mais a negociação entre devedor e credores, sempre buscando a preservação da atividade empresarial.
Além disso, a possibilidade da recuperanda negociar com seus credores e alcançar a aprovação do seu plano de recuperação judicial sem necessidade de realizar a Assembleia Geral de Credores, apenas utilizando os termos de adesão, mostra-se também um meio mais econômico (se for bem sucedido) de se atingir o mesmo resultado.
Isso porque, o custo da recuperanda, do Administrador Judicial e dos credores com a realização e/ou comparecimento à AGC é considerável (publicação de edital de convocação, locação de espaço, contratação de equipe, deslocamentos etc.). Ao substituir o conclave pelos termos de adesão, este custo se extingue, havendo evidente economia de tempo e de recursos para todos os envolvidos.
Com relação à economia de tempo, ela não se refere apenas ao tempo que seria gasto pelos interessados para comparecer à AGC, mas também ao prazo legal mínimo exigido para a publicação do edital de sua convocação – 15 dias antes da data designada para a 1ª convocação –, bem como a previsão de convocação em duas datas diferentes como prazo mínimo de cinco dias entre elas (1ª e 2ª convocações).
Ou seja, caso seja possível substituir a AGC pelos termos de adesão, apenas com relação à convocação do conclave já são, pelo menos, 20 dias de ganho em termos de tempo e, isso sem considerar as diversas (e extremamente comuns) suspensões e consequentes redesignações das Assembleias de Credores.
Evidente que nem todas as recuperações judiciais terão os seus planos aprovados por meio de termo de adesão, já que cada caso tem suas peculiaridades. Mas a simples possibilidade de haver essa substituição, que decorre diretamente das tratativas entre a recuperanda e seus credores, mostra a evolução do sistema concursal brasileiro e a eterna busca por maior celeridade processual.
E, para aqueles que não acreditavam ou que tinham suas dúvidas quanto à utilização dos termos de adesão na prática, os casos acima citados mostram que este novo instrumento foi bem recebido pela comunidade jurídica e sua aplicação prática tem se mostrado bastante benéfica, com a diminuição dos custos e do tempo dispendidos pelas partes, mas sem se abrir mão da segurança jurídica.
Este deve ser mesmo o espírito de todos os envolvidos nos processos de recuperação judicial: buscar o melhor aproveitamento das inovações legislativas.
[1] Autos nº 5004765-23.2021.8.08.0024.
[2] Autos nº 1002559-69.2021.8.11.0041.
[3] TJES 5004765-23.2021.8.08.0002; TJSP: 1002559-69.2021.8.11.0041; TJSP: 1004719-59.2021.8.26.0038.
[4] Maria Fabiana Seoane Dominguez Sant’Ana e Mayara Isfer Osna, in Comentários à Lei de Recuperação de Empresas e Falência. Editora Foco: Indaiatuba, 2022, p.168/220.
[5] Art. 45-A. As deliberações da assembleia-geral de credores previstas nesta Lei poderão ser substituídas pela comprovação da adesão de credores que representem mais da metade do valor dos créditos sujeitos à recuperação judicial, observadas as exceções previstas nesta Lei. (…) § 4º As deliberações no formato previsto neste artigo serão fiscalizadas pelo administrador judicial, que emitirá parecer sobre sua regularidade, com oitiva do Ministério Público, previamente à sua homologação judicial, independentemente da concessão ou não da recuperação judicial.
Fonte: https://www.jota.info/artigos/termo-de-adesao-vs-assembleia-geral-de-credores-na-recuperacao-judicial